Na intervenção que vem sendo realizada com as mulheres do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) que vivem na ocupação da Unaf, em Planaltina, ação conjunta com o Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), a equipe do Centro de Referência em Direitos Humanos do Distrito Federal (CRDH/DF) iniciou também atividades com as crianças do local, filhas e filhos dessas mulheres.

Como a intervenção psicossocial não pode ocorrer sem apoio de pessoas para acompanhar as crianças que são filhos dessas mulheres, a equipe viu nessa necessidade, a aoportunidade de atuar também com esse grupo.

A psicóloga Larissa Tavira explica como essa atividade tem ocorrido. “Num primeiro momento nos aproximamos delas, fornecendo cuidados com o quais elas não estão acostumadas. A maioria ainda não está inserida no espaço escolar e não tem essa vivência, que são coisas aparentemente muito simples, como sentar pra comer coletivamente, pedir pra ir ao banheiro, de silenciar num momento que exige um ambiente mais silencioso e de atenção, or exemplo”.

“Esse é o momento de garantir um espaço e uma vivência voltada para essas crianças, para que elas sejam cuidadas e recebam atenção apropriada. Quando chegamos, elas sempre ficam muito animadas, e essa é a parte mais emocionante”, conta Larissa.

As crianças que vivem na ocupação, principalmente as mais novas, que têm até 5 anos de idade, talvez desconheçam completamente o que é morar na própria casa. Para a psicóloga, o contexto fornece questões importantes.

“Após estabelecermos esse vínculo, é possível começar a buscar as percepções delas sobre o que é ter uma casa, viver em uma casa, sonhar com uma casa, o que elas entendem por estar naquele espaço e viver daquela forma. É interessante que essa experiência sirva como um observatório sobre essas questões, pra sabermos qual a noção de lar que elas têm, porque elas já nascem num espaço que se dá pela luta, pela reivindicação por direitos humanos”. Depois disso, é que se pode, segundo Larissa, construir um trabalho mais efetivo e estruturado de psico educação.

Sensibilidade
A assistente social Nair Meneses relata que, durante os atendimentos, “percebemos que muitas mães, principalmente as que não trabalham fora, estão muito exauridas, por cuidarem das crianças em tempo integral. O espaço não oferece nenhum tipo de suporte a essas mulheres. Nâo tem brinquedos, biblioteca, absolutamente nada que as ajude. Mas sentimos que elas têm fome de outros saberes, além da televisão”, evidencia Nair.

De acordo com a assistente social, com o acúmulo dos encontros, as práticas de socialização surtem efeitos na forma como as crianças convivem entre si, principalmente pela dimiuição da violência e mais uso da comunicação.

As mães, por outro lado, não suportavam ou mesmo se autorizavam a ter um momento para elas, porque aprenderam a viver exclusivamente para os filhos.

“E ainda não aprenderam a suportar que os filhos sejam cuidados por um outro adulto. Isso parece muito simples, mas tem um valor simbólico muito grande, porque é necessário que essas mães possam desenvolver mais autonomia, para que seja possível lidar melhor com essas questões no momento em que conseguirem um emprego, e quando suas vidas passarem pelas mudanças necessárias. As crianças também precisam dessa autonomia. Todos os lados precisam crescer de forma independente”, aponta Larissa.

Lourival de Carvalho, advogado que integra a equipe do CRDH/DF, acredita que é a partir do contato com as crianças que as formas e metodologias para se trabalhar direitos humanos com elas surgem de forma mais evidente. “O desafio que temos pela frente é dar um sentido mais sólido para isso”, acrescenta.