Por Marcos Resende

“Autoconhecimento” é uma palavra que está na moda. Em ambientes de pessoas voltadas para assuntos relacionados à Nova Era, até para um modo “zen” de se viver, esse termo é usado com frequência. Todavia, poucos sabem ou mesmo compreendem o seu significado. Antes de tudo, deve ficar claro que autoconhecimento não é conhecimento informativo. No sentido usual que damos à palavra “conhecimento”, disso não se trata. Isso porque o saber, como o concebemos, vem de fora para dentro, enquanto o autoconhecimento brota de dentro para fora. Nossa cultura ocidental tem, de forma arraigada, a noção de conhecimento como informações que são obtidas do meio externo, que são processadas na mente para atuação no mundo exterior. A nossa educação, desde a tenra infância, foi assim. As informações eram trazidas de fora para dentro e tínhamos que decorar tantas coisas para passar nos exames, sendo que quase tudo que decoramos já esquecemos. Todo o desenvolvimento tecnológico, o exercício das profissões, tudo isso requer conhecimento, informação que se acumula em cima de outras informações e, neste sentido, há sempre os que sabem e os que não sabem. O conhecimento convencional é muito importante no que diz respeito à existência material. Não se pode construir uma ponte desprezando-se o conhecimento da engenharia. Para se comunicar com um estrangeiro, precisa- -se conhecer a sua língua ou ambos necessitam falar um idioma que lhes seja comum. Para tudo o que se queira realizar no plano material, há os especialistas e, em cima do conhecimento acumulado, novos conhecimentos vão sempre sendo agregados. O autoconhecimento nada tem a ver com conhecimento acumulado. Ao contrário, trata-se de um movimento da consciência que busca ver as coisas como elas são e, portanto, livre de acumulações ou preconceitos que impedem ou distorcem a percepção da Verdade. Enquanto o conhecimento é absolutamente necessário para todos os aspectos da vida material, no que diz respeito a compreender a Vida, a nós mesmos, ao que estamos fazendo nesta breve passagem pelo planeta, a tudo aquilo que é essencial a um viver pleno e feliz, o saber acumulado pode ser um estorvo, um empecilho à descoberta da Verdade. Autoconhecimento, que não é conhecimento acumulado, é uma atitude perante a Vida, uma postura de aprendizado. Não é algo para depois se colocar em prática, porque – quando realmente se aprende – a prática é naturalmente condizente com o aprendizado. Por isso, há uma diferença significativa entre o aprender intelectual e o aprender real. Enquanto o aprendizado meramente intelectual é simples acumulação de informação e possibilita que achemos que sabemos (sendo, muitas vezes, dissociado da ação), no aprendizado real, compreensão e ação constituem um único movimento espontâneo. O autoconhecimento é um despertar ou desabrochar a partir de dentro. Para que ele ocorra, precisamos ter liberdade, em nossa mente, com relação aos conhecimentos acumulados. Se estamos com a mente entulhada de informações, como uma biblioteca ambulante, não temos olhos para ver as coisas de uma maneira nova, como é a realidade, que é sempre nova. O autoconhecimento nos leva ao encontro com a Verdade, que significa ver as coisas como elas são, sem as distorções causadas pelos padrões mentais anteriormente adquiridos. Normalmente, o que nos impede de ver a Verdade (ou as coisas como elas são) consiste das nossas próprias opiniões, preconceitos e julgamentos que temos sobre tudo e sobre todos. A pessoa que está aprendendo ouve mais do que fala. Quando se manifesta, ela expressa algo adequado, justo, equilibrado, o que significa sabedoria. Mas o verdadeiro sábio, que é aquele que está sempre aprendendo, não se acha sábio. Ele percebe que é como um grão de areia em um universo infinito e, portanto, sabe que o aprendizado também é infinito. Mas ele procura esvaziar a sua mente para poder olhar agora de forma intensa, penetrante e profunda. Assim diziam os sábios antigos: “Tudo o que sei é que nada sei”. Essa é a postura daquele que está pronto para aprender, não no sentido de acumular informações, mas de ver as coisas como elas são, sem as deturpações que nossos “óculos” mentais se interpõem na nossa visão. Esses “óculos” são as nossas experiências passadas, tudo aquilo que achamos que sabemos. Autoconhecimento, portanto, é um desbravar de nossa natureza interna e sua relação com as coisas externas; é a percepção de motivações, ânsias, pressões e interesses ocultos vindos de nós mesmos ou do mundo externo. O autoconhecimento não pode ser atingido, porque o aprendizado é infinito. Não pode ser adquirido, porque não é o acúmulo de informações e nem mesmo de experiências. Trata-se, na realidade, de uma atitude de observação cuidadosa, criteriosa, isenta, não julgadora, de tudo o que se passa dentro e fora de nós. A isenção, neste caso, não significa indiferença, mas estar-se seriamente interessado em perceber e compreender as forças contraditórias operantes e o fluxo de energias que se move constantemente em nossa subjetividade, impulsionando nossas ações no mundo externo, sem uma postura de condenação, mas de observação. A cada momento, desempenhamos papéis diferentes. Às vezes, estamos nervosos; em outras, somos “bonzinhos”. Em algumas ocasiões, somos brincalhões; em outras, pessimistas; ora somos magoados ou ficamos raivosos. Tantas são as variações subjetivas que ocorrem em nosso espaço interno! Por mais que nem sempre façamos demonstrações externas de todas essas variações de humores, de emoções e de pensamentos que permanentemente fluem em nossa subjetividade, elas estão ali, quer as percebamos ou não. Quando não as percebemos, somos completamente escravizados por elas. Somente olhando para tudo isso com isenção, no momento em que as coisas estão acontecendo, é que podemos pacificar nossa natureza múltipla em conflito, para que, serenando, harmonizando, integrando e arejando nosso espaço interior, possamos permitir que a luz do sol interno possa brilhar em nossa consciência mais profunda, apontando a direção para a ação correta, sábia e amorosa. A transformação do mundo passa necessariamente pela transformação do indivíduo, ou seja, de cada um de nós. O autoconhecimento é trabalho de cada um. Ninguém pode fazê-lo por nós.